O setor florestal e bioindústrias associadas contribui com mais de 5 por cento do PIB nacional e representa cerca de 10 por cento das exportações portuguesas, sublinha Gonçalo Almeida Simões, diretor-geral da Biond – Forest Fibers from Portugal, associação das bioindústrias de base florestal.
Mas, aos indicadores económicos junta-se ainda a importância deste setor para a sustentabilidade e a coesão territorial. “É um setor que tem sido responsável pela fixação de comunidades e criação de emprego e riqueza em zonas particularmente desfavorecidas”. “A bioindústria de base florestal tem um papel de destaque na economia nacional””
A Biond, que anteriormente se designava por Associação da Indústria Papeleira, passou a chamar-se Biond – Forest Fibers from Portugal. Foi uma mudança de posicionamento da associação que reflete a evolução da sua atividade? Foi uma evolução natural. Não deixámos de ser o que éramos, mas acrescentámos mais áquilo que nos definia.
Esta fileira apresenta-se hoje como um extraordinário exemplo de inovação que já está a moldar o caminho de reinvenção de muitos domínios da indústria nacional. Refiro-me ao vasto leque de novos produtos e aplicações das fibras de base florestal, que vão dos têxteis às embalagens de vanguarda, muito mais sustentáveis do que as que são fabricadas com produtos de origem fóssil, por exemplo. Qual é o peso atual da indústria papeleira no setor florestal e na economia portuguesa e o seu impacto direto e indireto nas exportações e no emprego?
O setor das bioindústrias de base florestal, especialmente a fileira representada pela Biond, tem um papel de destaque no panorama económico nacional. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o setor florestal e bioindústrias associadas contribui com mais de 5 por cento do PIB nacional e representa aproximadamente 10 por cento das exportações portuguesas. Estes números sublinham a importância do setor não apenas como fonte de riqueza, mas também como um pilar estrutural para a balança comercial do país. No ano passado, o setor da pasta, papel e cartão atingiu um volume de exportações de 3.101 milhões de euros.
Por sua vez, o valor das importações, nesse mesmo ano, foi de 1.455 milhões de euros. Significa isto que o setor da pasta, papel e cartão mantém um elevado saldo da balança comercial, sendo o valor das exportações mais do dobro das importações. Somos, de forma consistente, uma bioindústria estratégica para Portugal.
Um setor que tem sido responsável pela fixação de comunidades e criação de emprego e riqueza em zonas particularmente desfavorecidas, com elevado impacto na coesão territorial. Sublinho que esta fileira promove a transferência direta de 325 milhões de euros das empresas que a constituem para a economia rural dos 18 distritos do Continente. Quais são os principais mercados de exportação para os produtos portugueses de papel e celulose? E como avalia a competitividade de Portugal neste setor? A qualidade dos produtos das associadas da Biond encontra compradores em praticamente todas as geografias. Estamos a falar de 180 mercados, distribuídos por todos os continentes.
No top dez dos principais mercados da nossa fileira estão sete países europeus. E, desses, os três primeiros são Espanha, França e Alemanha que representam em conjunto mais de 40 por cento das nossas exportações. Relativamente ao potencial de crescimento, considerando que a bioindústria portuguesa de pasta, papel e cartão é uma das mais eficientes do mundo, acreditamos que poderemos vir a beneficiar da crescente procura por produtos sustentáveis e recicláveis. Esse é, sem dúvida, um ponto muito positivo, que nos faz olhar para o futuro com otimismo realista. A sustentabilidade é um tema cada vez mais valorizado nos mercados internacionais. Como é que as empresas portuguesas deste setor têm vindo a integrar estas exigências? Nós dizemos com propriedade, porque demonstramo-lo com factos, que Biond é sinónimo de sustentabilidade. Desde a produção florestal, onde também participamos, até ao desenvolvimento industrial dos produtos.
Na floresta, a Biond e as empresas associadas gerem atualmente mais de 194 mil hectares, abrangendo várias espécies, o que representa mais de 5 por cento da floresta nacional, que em Portugal pertence, em grande parte, a pequenos proprietários privados. A Biond identificou, há alguns anos, a necessidade de demonstrar como é possível reduzir o risco de incêndio enquanto se aumenta a produtividade e os rendimentos dos pequenos proprietários florestais, contribuindo, assim, para a coesão do território.
Foi com esse objetivo que lançou uma série de Programas Operacionais de Norte a Sul do país, do Minho ao Algarve. Estes projetos, de adesão voluntária e com um caráter demonstrativo, são integralmente financiados pela Biond. Entre 2018 e o final de 2024, estima-se que cerca de 90 mil hectares sejam intervencionados, beneficiando aproximadamente 10.000 pequenos proprietários em áreas de minifúndio. Os resultados têm sido expressivos: as áreas 16 | Pg | destaque geridas pela Biond apresentam uma incidência de incêndios 3,6 vezes inferior em comparação com áreas não intervencionadas, além de um aumento de 23 por cento na produtividade. No plano industrial, o compromisso com o ambiente tem sido notável, com fortíssimos investimentos em gestão ambiental e tecnologias limpas.
Segundo a última informação disponível, do INE, este setor investiu mais de 31 milhões de euros em ações de proteção ambiental. Nos últimos 10 anos, as bioindústrias de base florestal investiram perto de 160 milhões de euros com vista a reduzir o seu impacto ambiental. Com estes investimentos alcançou-se uma redução de 4 por cento na emissão de gases com efeito de estufa por tonelada de produto.
Os biocombustíveis continuam a representar a fração dominante dos combustíveis consumidos por este setor, representando 87 por cento do total, e a produção de energia verde representa 5,8 por cento do total da energia produzida no país. O Prémio Floresta é Sustentabilidade, que a Biond atribui anualmente, tem cumprido esse papel de promover uma floresta mais sustentável?
O Prémio Floresta é Sustentabilidade, promovido pela Biond, tem desempenhado um papel crucial na promoção de uma floresta mais sustentável em Portugal. Com o objetivo central de contribuir para um mundo melhor para as gerações futuras, este prémio reconhece e incentiva iniciativas que valorizem os aspetos ambientais, sociais e económicos das florestas portuguesas. Ao premiar projetos alinhados com esses valores, o Prémio não apenas reforça a importância de cuidar das florestas, mas também motiva indivíduos, organizações e comunidades a investirem em práticas sustentáveis com a crescente digitalização, como tem evoluído a procura por produtos de papel tradicional e como é que o setor se tem adaptado às mudanças no consumo? Embora vivamos na era do digital, o papel continuará a ter o seu lugar especial.
É inegável que os suportes digitais ocupam um espaço crescente na nossa vida quotidiana, mas a “euforia digital” tem vindo a dar lugar a uma visão mais madura e equilibrada, que reconhece tanto as vantagens quanto as limitações dos meios eletrónicos. A Declaração de Stavanger, assinada por uma centena de investigadores e cientistas europeus, destaca a importância do papel impresso e da escrita manual, especialmente no contexto educativo. Esta não é uma questão de “impresso versus digital”. Trata-se de compreender que cada meio tem as suas especificidades e virtudes, e que o maior benefício está em aproveitar a complementaridade entre eles.
Tanto na educação como noutras áreas, o equilíbrio entre papel e digital é o caminho mais enriquecedor, permitindo-nos tirar o melhor partido de ambos e promovendo aprendizagens e experiências mais completas e eficazes. Quais são os principais projetos da Biond para os próximos anos e como prevê a evolução do setor?
As bioindústrias de pasta, papel, cartão e outros produtos posicionam-se como um dos pilares fundamentais da bioeconomia, destacando-se pelo potencial de transformação e inovação. Estas unidades estão a evoluir para verdadeiras biorrefinarias, onde a madeira, a biomassa florestal e os subprodutos industriais e florestais são convertidos, de forma eficiente em termos energéticos e ambientais, numa ampla gama de produtos: bioprodutos e bioenergia, capazes de substituir os produtos de origem fóssil. Até 2050, segundo estimativas da CEPI (Confederação Europeia das Indústrias do Papel), o Valor Acrescentado Bruto (VAB) do setor deverá crescer cerca de 50 por cento, com 40 por cento deste aumento atribuído à produção de novos bioprodutos que existem ou estão em fase de desenvolvimento.
Estes avanços reforçam o papel do setor como motor de inovação sustentável, alinhado com os objetivos de uma economia mais verde e circular. Parte deste sucesso depende das políticas públicas que vierem a ser adotadas, nomeadamente a nível europeu, em que por via do Clean Industrial Deal a União Europeia terá agora uma nova oportunidade para reposicionar o setor industrial europeu.
A nível nacional há também a necessidade absoluta de uma política de gestão florestal que permita um território ordenado e resiliente, com capacidade para abastecer o setor com matéria-prima, para além das necessárias condições regulatórias que ainda são prerrogativas nacionais, permitindo o desenvolvimento industrial do setor.